terça-feira, 30 de novembro de 2010

Neva em Castro Laboreiro II




Neva em Castro Laboreiro!




A noite de ontem caiu branca, fria e calma!
Na lareira estala o lume entre o carvalho, o vido e a giesta;
numa dança luxuriante aquece toda a casa
que abafada lança uivos de calor.
Na panela salta o presunto, o chouriço e o toucinho;
Numa serenidade inquietante o céu beija a terra
numa manta branca tecida de neve,
Deus chegou!

sábado, 27 de novembro de 2010

Critérios da Acção Pastoral


Análise do VI Capítulo do livro:
 Teologia Pastoral, Julio A. Ramos,
 Madrid, 1995, pp. 101-122;

Parte I: Resumo do Capítulo

A Igreja nas suas diversificadas acções quanto ao espaço, ao tempo e às situações humanas têm uma origem, uma direcção e um destino comuns. Quer dizer, a Igreja na sua acção pastoral contínua no mundo a mediação sacramental de Cristo e procura levar a salvação oferecida por Jesus Cristo a toda a humanidade. É esta missão potenciada pelo Espírito que assegura a identidade da mesma Igreja. Neste sentido podemos dizer que os critérios da acção pastoral são critérios comuns a todas as acções da Igreja, para que sejam pastorais. Estes critérios são teológicos porque brotam da fé, da identidade eclesial fruto da revelação e do acontecimento central do mistério pascal de Jesus Cristo. “Estes critérios terão que estar presentes em todas as fases da metodologia e da teologia pastoral: na análise das situações eclesiais; na projecção de situações novas; na estratégia para passar de umas às outras” (p. 102).

I.                   Critérios que brotam da continuidade da missão de Cristo

1)    Critério teândrico

A Igreja continua no mundo a missão de Cristo sem ser Cristo. Quer dizer, “a estrutura teândrica da encarnação de alguma maneira repete-se na estrutura eclesiológica” (p. 102) e a acção pastoral reveste-se de acção divina e humana como em Cristo se uniu a natureza humana e divina numa só pessoa. A acentuação de uma só perspectiva em relação a Cristo redundou nas heresias cristológicas e em relação à acção pastoral redunda em desvios da mesma acção pastoral. “A acentuação da acção divina na vida da Igreja deu origem ao quietismo pastoral […]; a acentuação da parte humana levou historicamente a um naturalismo pastoral que, prescindiu da autoria de Deus na história da salvação e em cada salvação pessoal, compreendeu a acção eclesial e a instituição como produto da iniciativa e dos interesses humanos” (p. 103). Precisamente contra estas concepções realça-se a missão eclesial como continuidade da missão de Cristo. Claro que acção humana condiciona positiva ou negativamente toda a acção da Igreja. Mas a oferta que Deus faz da salvação à humanidade exige a mediação humana como o mistério da encarnação exigiu a mediação de Jesus Cristo. Assim, a acção pastoral é o lugar ou meio de actuação de Deus na história. Isso exige ou pressupõe a fé; a confiança; a esperança; que Deus seja o protagonista; que seja encontro do ser humano e do mundo com Deus; que se confronte a acção pastoral com acção de Deus e com a revelação. “A oração, a celebração, a contemplação pertencem intrinsecamente à acção pastoral e descobrem na Igreja a presença e a acção últimas de Deus nela” (p. 104). A planificação pastoral e o consequente confronto com os planos de Deus pertence ao ser humano que é assistido e enviado pelo Espírito do Ressuscitado que em liberdade responde ao apelo de Deus.

2)    Critério Sacramental

O Concílio Vaticano II definiu a Igreja como sacramento de Salvação (LG 1), em consequência a acção pastoral que realiza reveste-se de carácter sacramental. Esta sacramentalidade brota de Cristo pois a Igreja é no mundo continuação da mediação sacramental do seu corpo. A Igreja é Corpo de Cristo sob a força do Espírito Santo. Assim, a acção pastoral está ao serviço “da comunhão de Deus com os homens e dos homens entre si” (p. 105). Se isto não acontece pode reduzir-se a exterioridade que oculta a verdade fundamental. A Exterioridade da acção da Igreja está ao serviço da interioridade. A visibilidade da acção pastoral não pode perder-se num puro subjectivismo. “A instituição na Igreja é necessária, ainda que os níveis de instituição sejam distintos no seu ser e no seu significado” (p. 105). Dentro deste mesmo critério “deve ser abordado todo o tema do ministério e da apostolicidade” (p. 105). Daqui pode-se concluir da responsabilidade de conservação e transmissão da fé, da actualização sacramental do mistério pascal e da unidade da ou na Igreja bem como da necessidade, por ser sacramento, de uma estrutura visível. “Toda a estrutura e acção pastoral pelo seu carácter sacramental é significativa, isto é, faz referência a algo que está além do sensível” (p. 106). A acção pastoral caracteriza-se pela sua eficácia no meio do mundo porque significa e torna presente a salvação no meio do mundo. Assim, a Igreja não pode deixar a instituição e a visibilidade pois tornar-se-ia num espiritualismo desencarnado; não pode fazer valer a instituição pela instituição; não pode permanecer numa acção fechada sobre si mesma mas abrir-se ao mundo sendo motivo e fundamento de esperança.

3)    Critério de Conversão

Vimos, anteriormente, que a Igreja continua no mundo a mediação sacramental de Jesus Cristo mas, muitas vezes, a mediação do Corpo de Cristo e a mediação do corpo eclesial diferem. No mistério da Encarnação Cristo torna-se na revelação mais perfeita de Deus, não podemos dizer o mesmo da palavra e da acção pastoral da Igreja, porque esta carrega em si o peso da pequenez, do pecado e da contingência humana. Por isso a Igreja na sua peregrinação reconhece os seus pecados e a constante necessidade de conversão para voltar aos fundamentos da sua acção. Não se trata de dizer que o pecado faz parte da essência da Igreja mas que ela é santa e pecadora e que o pecado reflecte a sua encarnação no mundo – a sua dimensão humana e histórica. Esta a afirmação não se repercute em todas as acções da Igreja pois as acções sacramentais são assistidas pelo espírito de Jesus Ressuscitado, o qual está presente e operante na mesma acção da Igreja. O problema reside quando se quer dar a toda a acção pastoral a autoria divina da mesma, quando se identifica toda a postura contra a Igreja como postura contra Deus ou quando fazemos da Igreja a encarnação permanente da divindade – isto é triunfalismo. Por outro lado, em várias situações, identificou-se a palavra com o portador da palavra e não se ouviu a voz de Deus. Para colmatar estas lacunas a Igreja terá que reconhecer a distância que a separa de Jesus e permanentemente estar numa atitude de conversão. “A conversão continua, a purificação constante como exigência do seu mesmo ser, converte-se assim em critério para a sua acção pastoral. As reformas na Igreja são necessárias, mas realizadas do seu interior” (p. 109).

II.                 Critérios que brotam do caminho para o Reino

1)  Critério de historicidade

O facto de vermos a Igreja como continuidade da obra de Cristo recorda-nos a história como elemento fundamental de toda a sua acção. Não se trata de uma história de carácter arqueológico mas de uma história aberta ao futuro porque a Igreja transporta em si mesma a dimensão escatológica da sua existência – caminho para a plenitude já presente mas ainda não totalmente manifestada. A Igreja caminha para a consumação escatológica, daí a diferença e a tensão entre a Igreja e o Reino que faz com que a Igreja não se instale num momento da história sentindo-se como o Reino definitivo. Por isso, tem que ser critica consigo própria e com as suas acções. A Igreja – Povo de Deus – reconhece a presença de Deus e actua na história humana criando as acções e as estruturas necessárias para a evangelização. Muitas acções e muitas estruturas mantêm-se e muitas outras desaparecem porque já não respondem às necessidades históricas da missão. A Igreja tem que procurar dar um acompanhamento pessoal que respeite o crescimento de cada pessoa. “A Igreja não pode prescindir da história pessoal de cada homem e construir ao seu lado uma história de salvação que ele ignora” (p. 110). A pastoral não pode ser abstracta mas tem que ser de acompanhamento pessoal encaminhando para a comunidade e dentro de uma pastoral comunitária. O progresso pastoral patente na tensão entre a Igreja e o Reino exigem objectivos a longo prazo e não acções para responder a imperativos pontuais e que se esgotam na sua realização. Daqui deriva a necessidade de uma viva dimensão profética que abra caminhos e rasgue horizontes à acção do Espírito na Igreja.

2)    Critério de abertura aos sinais dos tempos

“Os valores do Reino não se encerram somente dentro dos limites visíveis da Igreja, mas transcendem-na” (p. 111). O Espírito suscita valores do Reino no meio da humanidade e no mundo sem que a Igreja tenha exclusividade sobre eles. A Igreja tem que estar atenta e aberta aos sinais dos tempos e isso implica: uma leitura crente da realidade; uma confrontação da realidade com o Evangelho para discernir se é sinal do Reino para o potenciar ou combater; uma descoberta das interrogações mais profundas e quais as respostas esperadas para o presente e para o futuro; descobrir se Deus chama para uma nova realidade de actuação; uma atitude de abertura que penetre na vida do ser humano; uma valorização do mundo como presença ou realização incipiente do Reino. Perante estas perspectivas apresentadas percebemos que não nos podemos deter apenas na perspectiva teológica das situações ou apenas no discernimento teológico mas temos que ter uma postura crítica das ideias, ideologias e acções da humanidade; a Igreja não se pode alhear do ser humano como nos diz o Concílio Vaticano II (GS 1). Em todas as circunstâncias a Igreja é desafiada a apresentar uma doutrina iluminadora do sentido da realidade e das opções segundo as exigências do momento histórico na fidelidade à missão, claro que isto só é possível se houver um compromisso concreto com a realidade.

3)    Critério de Universalidade

“A universalidade da salvação é imperativo e critério para a acção de uma Igreja que, graças ao Espírito do Ressuscitado, interioriza, actualiza e universaliza o mistério de Cristo como oferta para todos os homens” (p. 113). O acolhimento por parte de todo o ser humano da salvação é missão da Igreja, para isso tem que encarnar todas as realidades humanas, culturais e sociais para as impregnar do Espírito de Jesus Cristo e conduzi-las à comunidade eclesial. Para esta missão que é qualitativa e quantitativa todos os membros da Igreja são agentes da sua acção. Claro que o universalismo da missão não pode redundar num universalismo de falta de critérios e de falta de crítica na evangelização originando crentes de tipo ‘camaleão’ que não mudam comportamentos nem aderem de coração a Cristo ressuscitado; ou, por outro lado, no fechamento em grupos e métodos que não permitem a entrada de ninguém, a nível de grupos e de pessoas. A Igreja é em si mesma universal, missionária, colegial e corresponsável e em todas estas perspectivas não pode esquecer a sua missão que é continuar no mundo a missão de Cristo – dar a conhecer e amar o Reino de Deus. Aqui desempenha sinal de vitalidade e de identidade uma opção clara pelos pobres (tesouro da Igreja). 

III) Critérios que brotam da presença e da missão no mundo

1)                Critério do diálogo

A missão da Igreja não se esgota nos meios intraeclesiais pois tem como destinatário da acção o mundo. A história da salvação mostra-nos um Deus que dialoga com o ser humana e essa deve ser também a atitude da Igreja – a Igreja ao serviço da revelação. “A acção pastoral entende-se, assim, como palavra dirigida ao mundo que actualiza a Palavra feita carne para nossa salvação” (p. 115). Ter a revelação de Deus como paradigma da pastoral foi a proposta do Papa Paulo VI na Encíclica Eclesiam Suam da qual se retiram as ideias seguintes: a Palavra da revelação nasce da iniciativa divina; a Palavra da revelação surgiu do amor e a Igreja pode ter uma palavra para o mundo se o amar; a Palavra da revelação é uma proposta a todos (não cabem aqui fundamentalismos ou fanatismos). A identidade da acção eclesial é referencial a Cristo e ao Reino, quando se perde esta referência identificadora a Igreja cai num monólogo e deixa de ter novas e diferentes propostas de acção. “Dialogar não é só lançar a própria mensagem, mas receber do outro para assumi-lo e critica-lo” (p. 117).

2)    Critério da Encarnação

Os sinais que levam ao mundo a transcendência têm consigo uma dimensão cultural que não pode ser esquecida na acção pastoral. “A encarnação de Jesus Cristo e a sua prolongação pneumática no mistério da Igreja implicam um aspecto cultural que ultimamente temos denominado de inculturação” (p. 117). Na encarnação Jesus assume uma cultura concreta nas suas diferentes dimensões: linguagem, tradições, modos de vida, etc. Precisamente no Pentecostes como antítese de Babel compreendemos que em Cristo as diferentes culturas se podem compreender. Assim, a pastoral também é um fazer cultura, “o Evangelho é anunciado e actua na acção pastoral da Igreja graças à mediação da cultura de cada povo e, por sua vez, a sua actuação cria cultura, modos de vida que são depois âmbitos da evangelização” (p. 118). No entanto, o Evangelho não se pode reduzir a uma cultura ou a um povo porque não se identifica com nenhum em particular para se poder identificar com todos, melhor, “purifica e eleva as distintas culturas” (p. 118). “Um Evangelho não encarnada em moldes culturais é irrelevante e um Evangelho que não produz cultura é ineficaz e abstracto” (p. 119).

3)    Critério de missão

A missão de Jesus é continuada pela Igreja – povo de baptizados – porque no Baptismo todos recebemos a missão de Cristo sob acção do Espírito Santo. “Esta missão é a evangelização de todos os homens, base da identidade de toda a acção pastoral” (p. 120). Sempre que se perde a identidade degrada-se a missão, quando a Igreja perde unidade perde identidade e caminha para a autodestruição. Não se trata de um uniformismo que também degrada a missão tornando-a abstracta (sem ter em conta os distintos agentes e distintos destinatários) mas trata-se de unidade no essencial – a missão. Trata-se de partir da dinâmica da missão para acolher “uma pastoral de conjunto que conjugue perfeitamente a unidade em torno da missão” (p. 121) e que não aceite que a Igreja ou que alguém esgote a missão de Jesus. “Toda a acção pastoral da Igreja, que participa da sua missão, tem como fim a comunhão” (p.121).

Parte II: análise crítica

O presente capítulo que estudamos está redigido de forma clara, concisa e fundamentada o que nem sempre acontece nestes âmbitos. Parece-me um texto fundamental que se fosse mais reflectido e conhecido poderia ajudar a eliminar muitos erros pastorais que se praticam em nome de vontades pessoais esquecendo totalmente a missão. Penso que o fundamental é educar e fazer uma pastoral de comunhão para que depois paulatinamente se possam introduzir todos os outros aspectos.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

O estudo de caso na investigação em Tecnologia Educativa em Portugal


Análise do artigo de
Clara Pereira Coutinho & José Henrique Chaves
Revista Portuguesa de Educação, 2002, 15 (1), pp. 221-243


Parte I: resumo do artigo

O estudo de caso como método de pesquisa tem vinda paulatinamente a ganhar o seu espaço na investigação, isto deve-se à “desvalorização da investigação desenvolvida sob o paradigma positivista” (p. 221). Na investigação das Ciências da Educação procuraram-se novas abordagens metodológicas que facilitassem a construção do “conhecimento e produção de significado por parte de quem aprende” (p. 222) em vez de se focarem apenas os meios como transmissores de informação. Naturalmente que neste campo os métodos quantitativos podem ter uma função importante de complementaridade aos métodos qualitativos. O estudo de caso pode englobar todas estas potencialidades, no entanto, não é fácil de pôr em prática e muitos estudos feitos segundo este método foram mal concebidos e mal conseguidos o que leva ao descrédito do método. Daí a pertinência do presente artigo.

O que é um estudo de caso?

A característica que melhor define esta abordagem metodológica é o estudo intensivo e restrito a um ‘caso’. Tudo pode ser ou originar um estudo de ‘caso’: uma pessoa, um grupo, uma organização, uma decisão, um incidente, etc. O ‘caso’ examina-se “em profundidade, no seu contexto natural, reconhecendo-se a sua complexidade e recorrendo-se para isso a todos os métodos que se revelem apropriados” (p. 223). Há autores que por estas características holísticas do método preferem a “expressão estratégica à de metodologia de investigação” (p. 223) entendendo que não se trata de uma metodologia específica mas apenas de uma forma de organizar dados de estudo específico e único. Por estas razões poucos autores procuram uma definição unívoca e ficam-se por ideias abrangentes, as quais podemos sintetizar:
- O caso é ‘um sistema limitado’, por isso, a primeira função do investigador é definir as fronteiras de forma clara e concisa do ‘seu’ caso;
- É um caso sobre ‘algo’ que se tem que identificar para que o foco e a direcção da investigação sejam claros;
- Preservar o carácter ‘único, diferente e complexo do caso’:
- A investigação decorre em ambiente natural;
- O investigador recorre a fontes múltiplas de dados e a métodos diversificados de recolha;
“O estudo de caso é uma investigação empírica que se baseia no raciocínio indutivo que depende fortemente do trabalho de campo que não é experimental que se baseia em fontes de dados múltiplas e variadas” (p. 225). A marca predominantemente descritiva e a implicação pessoal do investigador no estudo levam a que associem o ‘estudo de caso’ à investigação qualitativa o que é uma perspectiva errada porque o ‘estudo de caso’ pode ser usado noutros paradigmas de investigação. Por exemplo no campo da investigação educativa em geral existem estudos de caso que “combinam com toda a legitimidade métodos quantitativos e qualitativos” (p. 225).

Objectivos

“O estudo de caso pode ser conduzido para um dos três propósitos básicos: explorar, descrever ou ainda explicar” (p. 225) aos quais se pode juntar um quarto: avaliar e/ou transformar e assim temos presentes no estudo de caso os objectivos gerais da investigação educativa.

Tipologia

Com tantos ‘casos’ e objectivos a perseguir podemos perspectivar a diversidade tipológica de estudos de caso. “A primeira proposta a que todos os autores aludem é a divisão básica entre estudo de caso único e estudo de caso múltiplo ou comparativo ou multicasos” (p. 226). Segundo Stake existem três tipos: o estudo de caso intrínseco, o instrumental e o colectivo.

Constituição da amostra ou selecção do ‘caso’

No estudo de caso a selecção da amostragem é a sua “essência metodológica” (p.228) no entanto a investigação não se baseia na amostragem nem se estudo um caso para perceber outros mas para perceber o caso estudado. Assim, a escolha da amostragem baseia-se em critérios pragmáticos e teóricos buscando as variações máximas do mesmo. Seguem-se seis modalidades de amostragem intencional que podem dar origem a um estudo de caso:
1)      Amostras extremas (casos únicos que proporcionem dados muito interessantes);
2)      Amostras de casos típicos ou especiais;
3)      Amostras de variação máxima, adaptadas a diferentes condições;
4)      Amostras de casos críticos;
5)      Amostras de casos sensíveis ou politicamente importantes;
6)      Amostras de conveniência;
Nas amostras há características identificadoras que as demarcam das amostras probabilísticas típicas das abordagens quantitativas: processo de amostragem dinâmico e sequencial que permite alterações no evoluir do estudo; ajuste automático da amostra; o processo de amostragem só está concluído quando se esgotar a informação que pode ser obtida, finda com a saturação da amostra.

Situações de investigação a que se aplica

Quando não é possível manipular variáveis para determinar a relação causal ou quando a realidade é tão complexo que não permite identificar as vaiáveis eventualmente relevantes ou ainda quando é a única abordagem possível numa situação real e concreta. Com esta metodologia aprendemos que o caso é único e que o seu estudo profundo tem alguma coisa para revelar; só um estudo profundo pode apresentar aspectos importantes numa investigação complexa ou em novas situações de investigação; em complementaridade com outras metodologias pode dar contributos importantes que passariam despercebido num estudo de tipo experimental. Reconhecer as mais-valias implica também aceitar as críticas. Quando o estudo de caso é mau conduzido, por exemplo, extrapolação de um caso para dados universais ou então quando é puramente descritivo e não tem em conta outras abordagens ao mesmo assunto. “Questiona-se a credibilidade das conclusões a que conduz. A credibilidade é um conceito genérico […] que engloba em si os três critérios ‘clássicos’ de aferição da qualidade de um qualquer trabalho de investigação: a validade externa ou possibilidade de generalização dos resultados, a fiabilidade (replicabilidade) do processo de recolha de análise de dados, e para o estudo de caso de tipo explicativo, coloca-se ainda a questão do rigor ou validade interna das conclusões a que conduz” (p. 231).

O problema da validade externa ou generalização

Trata-se de uma falsa questão porque em certos estudos de caso a questão nem se coloca pois o estudo justifica-se pela sua unicidade, pelo carácter externo e ainda por ser irrepetível. Ou o caso pode ser de carácter negativo, “estudar o atípico pode servir para testar o típico” (p. 232). Esta problemática pode resumir-se na seguinte expressão: “tudo depende de saber se queremos debruçar-nos sobre o que é exclusivo ou o que é comum a outros casos” (p. 233).

A questão da fiabilidade

A questão da fiabilidade está intimamente relacionada com a replicabilidade das conclusões a que chega (possibilidade de diferentes investigadores produzirem os mesmos resultados). No estudo de caso isto não se pode aplicar porque um ‘caso’ não se repete. Para ultrapassar esta situação o investigador tem que descrever de forma pormenorizada todos os passos do processo de investigação.

A questão do rigor ou validade interna

Aqui trata-se do campo dos resultados e a questão é saber se a investigação conduziu àqueles resultados ou se eles são a imaginação do investigador ou as conclusões a que ele queria chegar. Para resolver este problema terá que usar, mais uma vez, a descrição pormenorizada e depois tem que fazer os chamados ‘protocolos de triangulação’. Triangulação das fontes e dados, diferentes fontes; triangulação do investigador em que observadores procuram detectar desvios derivados pelo investigador; triangulação da teoria; triangulação metodológica.

Em síntese

“Insistir na necessidade de se definir critérios para aferir da credibilidade dos estudos de caso – critérios esses que se aplicam não apenas a estudos de caso mas a toda a investigação qualitativa – não significa que esses critérios possam ser encarados de forma prescritiva como acontece nos estudos quantitativos” (p. 235). Trata-se de ser muito cuidadoso para ultrapassar as críticas inerentes ao método. Por outro lado apostar na descrição compacta daquilo que é o foco da questão e aprender a filtrar o essencial.
O que um relatório de estudo de caso deve incluir:
·         Definição clara do ‘caso’ e delimitação de fronteiras;
·         Descrição pormenorizada do contexto em que o ‘caso’ se insere;
·         Justificação da pertinência do estudo e os objectivos gerais;
·         Identificação da estratégia geral e as razões das opções todas: caso ‘único’ ou ‘múltiplo’;
·         Definição de unidade ou unidades de análise;
·         Fundamentação de pressupostos teóricos;
·          Descrição clara de como os dados foram recolhidos, de quem e quando
·         Descrição pormenorizada dos dados;
·         Justificação da lógica das inferências;
·         Definição dos critérios que aferirão a qualidade do estudo;

O estudo de caso na investigação nacional em TE

Os autores fizeram um levantamento de produção científica portuguesa na área da Tecnologia Educativa entre 1990-2000. Verificaram a reduzida quantidade (7 em 112) de trabalhos que usaram como metodologia o estudo de caso. Esses estudos são estudos de caso múltiplo, nenhum é intrínseco, um caso excepcional que justifique o seu estudo, são referidas fontes múltiplas e têm quadros teóricos de enquadramento.

Parte II - análise crítica

A leitura deste artigo permitiu-nos perceber a necessidade do mesmo para clarificar o que é o ‘estudo de caso’ como método ou melhor como perspectiva e organização para o estudo de um ‘caso’ usando fontes múltiplas e métodos diversos. O estudo de caso permite um conhecimento profundo do ‘caso em estudo’ se o processo for bem conduzido e bem descrito nos seus diferentes âmbitos de produção. Parece-me que o artigo está bem fundamentado e nota-se o esforço de síntese, de sistematização e de clarificação.
Numa perspectiva pastoral o ‘estudo de caso’ pode ter muita pertinência como ferramenta de conhecimento ou de aferição da realidade e a subsequente resposta pastoral. Sem este cariz científico é que se faz em muitas situações, nomeadamente no campo da espiritualidade.

MITP
César Maciel

sábado, 6 de novembro de 2010

A espiritualidade do Catequista e a Comunidade cristã


A espiritualidade do Catequista

A espiritualidade cristã, em sentido lato, corresponde ou compreende a forma como um cristão manifesta e vive a sua relação com Deus. Mais importante do que perceber a forma como o cristão celebra ou tem práticas religiosas é compreender como vive. A espiritualidade não é extrínseca mas intrínseca e quando é exterior é manifestação ou consequência de uma adesão interior.

O catequista e a sua espiritualidade estão enquadrados na vocação geral cristã – na vocação ou no chamamento permanente ao acolhimento da salvação oferecida por Deus que se concretiza na vocação à santidade. No entanto, a espiritualidade do catequista tem que estar além da vocação geral de todos os cristãos.

A “Boa Nova há de ser proclamada, antes de mais, pelo testemunho. Suponhamos um cristão ou punhado de cristãos que, no seio da comunidade humana em que vivem, manifestam a sua capacidade de compreensão e de acolhimento, a sua comunhão de vida e de destino com os demais, a sua solidariedade nos esforços de todos para tudo aquilo que é nobre e bom. Assim, eles irradiam, de um modo absolutamente simples e espontâneo, a sua fé em valores que estão para além dos valores correntes, e a sua esperança em qualquer coisa que se não vê e que não se seria capaz sequer de imaginar. Por força deste testemunho sem palavras, estes cristãos fazem aflorar no coração daqueles que os vêem viver, perguntas indeclináveis: Por que é que eles são assim? Por que é que eles vivem daquela maneira? O que é, ou quem é, que os inspira? Por que é que eles estão connosco?” (EN nº 21).

O catequista ideal não existe, não nasce mas faz-se em cada dia da sua existência. O Catequista, como todo o ser humano, está a construir a sua identidade enquanto pessoa e enquanto catequista. 

O “cristão-catequista” (Luis Otero – Joan Brulles) e nesta definição compreendemos que o catequista tem que ser mais do que um cristão – quer dizer, pela sua missão o catequista tem que ter uma outra vivência espiritual. Podemos dizer que do catequista se exige uma profunda maturidade espiritual de onde parte um convicto anúncio de Jesus Cristo. De uma adesão clara sob o acolhimento permanente do Espírito Santo o catequista transforma-se num anunciador claro de Jesus Cristo. Quer dizer, quanto mais o catequista tiver o seu coração convertido a Jesus Cristo e aberto à acção do Espírito Santo mais a sua vida se torna clara e deixam de existir sombras entre aquilo que ensina e aquilo em que acredita ou que testemunha. Esta responsabilidade e exigência depositadas no catequista não são motivo de desânimo ou de angústia mas motivação para um permanente crescimento espiritual, para uma permanente compreensão da missão do catequista. Ser catequista não pode ser ‘porque tem que ser’ ou porque ‘não há mais ninguém’ mas porque chamados aceitamos o convite e tudo fazemos com intensidade para sermos bons catequistas.



A comunidade cristã

O catequista está inserido numa comunidade cristã e é mandatado por ela para fazer catequese. Jesus recebeu uma missão do Pai – anunciar a Boa Nova da Salvação – e Jesus deixou uma missão aos seus discípulos – anunciar a Boa Nova da Salvação - e nós somos herdeiros e actualizadores permanentes dessa missão que Jesus deixou aos seus discípulos, que deixou aos cristãos, àqueles que querem identificar a sua vida com as atitudes e os gestos de Jesus.
É na comunidade cristã que se vive a fé em Jesus Cristo. Porquê? Porque a Igreja (com os seus pecados e suas virtudes) é a depositária da missão de Jesus.

 “A Igreja nasce da acção evangelizadora de Jesus e dos doze. Ela é o fruto normal, querido, o mais imediato e o mais visível dessa evangelização […] Enviada e evangelizadora, a Igreja envia também ela própria evangelizadores. É ela que coloca em seus lábios a Palavra que salva, que lhes explica a mensagem de que ela mesma é depositária, que lhes confere o mandato que ela própria recebeu e que, enfim, os envia a pregar. E a pregar, não as suas próprias pessoas ou as suas ideias pessoais, mas sim um Evangelho do qual nem eles nem ela são senhores e proprietários absolutos, para dele disporem a seu bel-prazer, mas de que são os ministros para o transmitir com a máxima fidelidade” (EN nº 15).

A adesão ou o acto de fé é uma decisão livre e pessoal mas nunca individual ou intimista porque cada um de nós faz uma adesão de fé à fé transmitida de geração em geração pela Igreja. A Igreja nasce da missão de Jesus e é enviada por Ele e nós participamos deste anúncio e desta missão. Por isso, uma opção de fé implica uma adesão à comunidade que a transmite e que é sua depositária. O catequista está inserido numa comunidade, é enviado e apoiado pela comunidade, por isso actua em nome dela e não em nome pessoal. Assim, os catequistas são enviados pela comunidade a testemunhar a sua fé que é a fé da Igreja. Porque, em primeira instância, quem faz a catequese é a comunidade e é esta que delega essa missão nos catequistas.

“Evangelizar não é para quem quer que seja um acto individual e isolado, mas profundamente eclesial. Assim, quando o mais obscuro dos pregadores, dos catequistas ou dos pastores, no lugar mais remoto, prega o Evangelho, reúne a sua pequena comunidade, ou administra um sacramento, mesmo sozinho, ele perfaz um acto de Igreja e o seu gesto está certamente conexo, por relações institucionais, como também por vínculos invisíveis e por raízes recônditas da ordem da graça, à actividade evangelizadora de toda a Igreja. Isto pressupõe, porém, que ele age, não por uma missão pessoal que se atribuísse a si próprio, ou por uma inspiração pessoal, mas em união com a missão da Igreja e em nome da mesma” (EN nº 60).
Em síntese, os catequistas são escolhidos e enviados em nome da comunidade, em nome da Igreja a anunciar não a sua fé mas a fé da Igreja. O grande desafio do catequista é a fidelidade a Jesus Cristo e à Igreja.  



A comunidade e iniciação cristã

O catequista participa da missão dada por Jesus aos discípulos; o catequista comunica de forma actual o Evangelho, a Tradição viva da comunidade eclesial, a forma como a Igreja acredita, celebra e vive.
O catequista é uma testemunha da experiência comunitária da fé, para isso, tem que conhecer a fé da comunidade e partilhar essa mesma vivência. Só assim o catequista poderá iniciar na fé os seus catequizandos. O catequista não pode apresentar o que ‘devia ser’ ou algo que é ‘utópico’ mas tem que apresentar e promover uma realidade. Quer dizer, o catequista tem que se apresentar e apresentar a comunidade como modelo ou exemplo do que ensina ou melhor, transmite e não como uma realidade que deveria existir. Trata-se de iniciar na comunidade. E iniciar na comunidade ou fazer a iniciação cristã é fazer um cristão.
A iniciação cristã é o processo que facilita ou possibilita a conversão, a construção de uma identidade crente e que leva à renovação da comunidade. Quanto mais autênticos forem os cristãos mais autêntica será a comunidade. E a identidade crente vai construir-se quando é posta em causa e quando ao ser posta em causa somos capazes de fundamentar em que acreditamos e com base nisso reconstruímos a nossa identidade num crescimento permanente. Neste processo catequético de iniciação é fundamental entrar na linguagem e nos conceitos que identificam e que fazem parte da comunidade cristã e explicitá-los, tanto quanto possível.
Uma iniciação cristã bem-feita levará as crianças ou os adultos a saber e a viver de forma cristã, tendo presente os principais elementos que constituem a sua fé, as respectivas mediações e as atitudes a ter.
A igreja faz a catequese e a catequese faz a Igreja, é nesta dinâmica permanente que o catequista se enquadra e promove.

Encontro de espiritualidade para Catequistas, 5 de Novembro de 2010 - Melgaço